Wednesday, December 19, 2012

Breve história do sinal nervoso - II


 

O numero de células nervosas existente em um cérebro humano é estimado em 100 bilhões. Cada uma pode fazer até 10 mil conexões com outras. Para elucidar parte do funcionamento deste órgão tão complexo a ciência teve que dar incontáveis passos.

No século XIX os instrumentos, como o microscópio, tinham muitas limitações. Um axônio, tendo a centésima parte do diâmetro de um fio de cabelo, não podia ser visualizado com nitidez. O que os cientistas da época viam aparentava ser uma rede contínua de células nervosas emaranhadas e fusionadas entre si. Entretanto, em 1871 um anatomista italiano, Camilo Golgi, fez uma descoberta importante em seu precário laboratório. Partes de tecido nervoso mergulhado em nitrato de prata mostravam no microscópio células nervosas tingidas de negro. Pela primeira vez, células nervosas apresentavam-se como um corpo do qual se desprende um conjunto de ramos ou dendritos e uma cauda longa, o axônio. Entretanto, Golgi seguiu pensando que todas as células formavam uma rede contínua por onde fluíam os sinais em varias direções e sentidos.

Um dos primeiros pesquisadores modernos a aproveitar a descoberta de Golgi foi o espanhol Santiago Ramon y Cajal. Estudou as células nervosas de pequenos animais e, com muito talento artístico, desenhou magníficas reproduções do que viu. Interpretou que existiam interrupções entre os diferentes processos dos neurônios e que cada um formava uma unidade separada e não parte de uma rede continua. Os sinais nervosos deveriam passar de neurônio a neurônio através das interrupções como em uma corrida de relevamento. Estas interrupções mais tarde vieram a ser conhecidas com sinapses. Ramon y Cajal também notou que os axônios que se conectam a receptores sensoriais como os da visão, audição e tato se orientam ao sistema nervoso central enquanto que os axônios que desencadeiam movimentos nos músculos apontam para a periferia. Concluiu que os neurônios conduzem sinais em um único sentido, recebendo as mensagens através dos dendritos e enviando-as através dos axônios. Estes sinais viajam por caminhos particulares e seria possível traçar estes caminhos através do sistema nervoso, desde o princípio até o final do trajeto. Esta descoberta permitiu aos cientistas estabelecer que estímulos sensoriais em distintas partes do corpo estão conectados com áreas especificas do cérebro. Na metade do século XX cientistas como Wade Marshal acumularam descobertas que poderiam ser sumarizada numa figura chamada “homúnculo sensorial”, uma ilustração das áreas do corpo em proporção a extensão de cérebro necessária para processar as informações sensoriais provenientes de cada uma delas.  

Experimentos na década dos 50 mostraram que cada neurônio, de alguma forma, sabe como chegar ao seu almejado destino. Robert Sperry e outros cientistas tentaram rearranjar alguns nervos em animais, com resultados estranhos: conectando nervos traseiros à parte anterior faziam que os animais enxergassem os objetos de pernas para o ar ou caminhassem de ré. Sperry teorizou que os nervos encontravam seus caminhos atraídos por sinais químicos emitidos pelos tecidos alvos. Poucos cientistas aderiram à hipótese mesmo depois que Rita Levi-Montalcini descobriu um produto químico denominado fator de crescimento nervoso (NGF) que se comportava de acordo à hipótese . Junto com Stanley Cohen, Rita terminou por provar que o NGF, uma proteína, estimula o crescimento de conexões nervosas. As fibras nervosas crescem em direção à fonte de NGF. Este NGF pode ser produzido ao redor da fonte por muitos tipos de células, permitindo às fibras encontrar seu destino almejado, mesmo dentro da densa massa de nervos que formam o cérebro.

Referências:

 Doidge, N. The Brain That Changes Itself (Viking Penguin, USA, 2007).
Farndon, J. Nerve Signalling: Tracing the Wiring of Life (Nobel Prize Organization, 2009).