Breve história do sinal nervoso - II
O numero de células nervosas
existente em um cérebro humano é estimado em 100 bilhões. Cada uma pode fazer
até 10 mil conexões com outras. Para elucidar parte do funcionamento deste
órgão tão complexo a ciência teve que dar incontáveis passos.
No século XIX os instrumentos, como
o microscópio, tinham muitas limitações. Um axônio, tendo a centésima parte do
diâmetro de um fio de cabelo, não podia ser visualizado com nitidez. O que os
cientistas da época viam aparentava ser uma rede contínua de células nervosas
emaranhadas e fusionadas entre si. Entretanto, em 1871 um anatomista italiano,
Camilo Golgi, fez uma descoberta importante em seu precário laboratório. Partes
de tecido nervoso mergulhado em nitrato de prata mostravam no microscópio células
nervosas tingidas de negro. Pela primeira vez, células nervosas apresentavam-se
como um corpo do qual se desprende um conjunto de ramos ou dendritos e uma
cauda longa, o axônio. Entretanto, Golgi seguiu pensando que todas as células
formavam uma rede contínua por onde fluíam os sinais em varias direções e
sentidos.
Um dos primeiros pesquisadores
modernos a aproveitar a descoberta de Golgi foi o espanhol Santiago Ramon y
Cajal. Estudou as células nervosas de pequenos animais e, com muito talento
artístico, desenhou magníficas reproduções do que viu. Interpretou que existiam
interrupções entre os diferentes processos dos neurônios e que cada um formava
uma unidade separada e não parte de uma rede continua. Os sinais nervosos
deveriam passar de neurônio a neurônio através das interrupções como em uma
corrida de relevamento. Estas interrupções mais tarde vieram a ser conhecidas
com sinapses. Ramon y Cajal também notou que os axônios que se conectam a
receptores sensoriais como os da visão, audição e tato se orientam ao sistema
nervoso central enquanto que os axônios que desencadeiam movimentos nos
músculos apontam para a periferia. Concluiu que os neurônios conduzem sinais em
um único sentido, recebendo as mensagens através dos dendritos e enviando-as
através dos axônios. Estes sinais viajam por caminhos particulares e seria possível
traçar estes caminhos através do sistema nervoso, desde o princípio até o final
do trajeto. Esta descoberta permitiu aos cientistas estabelecer que estímulos
sensoriais em distintas partes do corpo estão conectados com áreas especificas
do cérebro. Na metade do século XX cientistas como Wade Marshal acumularam
descobertas que poderiam ser sumarizada numa figura chamada “homúnculo
sensorial”, uma ilustração das áreas do corpo em proporção a extensão de
cérebro necessária para processar as informações sensoriais provenientes de
cada uma delas.
Experimentos na década dos 50 mostraram
que cada neurônio, de alguma forma, sabe como chegar ao seu almejado destino.
Robert Sperry e outros cientistas tentaram rearranjar alguns nervos em animais,
com resultados estranhos: conectando nervos traseiros à parte anterior faziam
que os animais enxergassem os objetos de pernas para o ar ou caminhassem de ré.
Sperry teorizou que os nervos encontravam seus caminhos atraídos por sinais
químicos emitidos pelos tecidos alvos. Poucos cientistas aderiram à hipótese
mesmo depois que Rita Levi-Montalcini descobriu um produto químico denominado fator
de crescimento nervoso (NGF) que se comportava de acordo à hipótese . Junto com Stanley Cohen, Rita
terminou por provar que o NGF, uma proteína, estimula o crescimento de conexões
nervosas. As fibras nervosas crescem em direção à fonte de NGF. Este NGF pode
ser produzido ao redor da fonte por muitos tipos de células, permitindo às fibras
encontrar seu destino almejado, mesmo dentro da densa massa de nervos que
formam o cérebro.
Referências:
Doidge, N. The
Brain That Changes Itself (Viking Penguin, USA, 2007).
Farndon, J. Nerve Signalling: Tracing the
Wiring of Life (Nobel Prize Organization, 2009).
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