Ressaca alcoólica
A ressaca pode ser definida como “mal estar em consequência
do consumo de álcool”. O álcool presente nas bebidas como vinho, uísque e
cerveja é o etanol; a ele me refiro, embora haja outros tipos como o metanol,
proveniente da madeira e usado de forma muito perigosa em bebidas adulteradas.
A ressaca é uma das manifestações da ação do álcool sobre
vários sistemas do organismo. Os sintomas são de tipos muito variados,
começando por fadiga, fraqueza, dores de cabeça, dores musculares, sede, náusea,
vômito, dores de estomago, vertigem, sensibilidade á luz e ao som. A atenção e
a concentração ficam diminuídas e o sono fica alterado, deixando de ser
reparador. O humor se altera, aparecendo
depressão, ansiedade ou irritação.
Existem muitos fatores que contribuem à formação de uma
ressaca. Em primeiro lugar estão os efeitos diretos do álcool: desidratação,
desequilíbrio eletrolítico, distúrbios gastro intestinais, hipoglicemia,
distúrbios do sono e dos ritmos biológicos.
Algumas horas depois do consumo de álcool, pode aparecer uma
síndrome de abstinência de curto prazo.
Também contribuem para a ressaca alguns efeitos não
atribuíveis ao etanol. As bebidas podem
ter outros compostos tóxicos, especialmente metanol. O uso concomitante de
outras drogas, especialmente a nicotina pioram o quadro. O tipo de
personalidade (ansioso, depressivo, frio, culposo, agressivo, etc.) também pode
ter influencia.
O único tratamento para a ressaca é a ingestão de água.
Secundariamente, em alguns casos, a glicose como alimento (comer) pode ajudar,
sendo desnecessária sua administração endo venosa. Não surte nenhum efeito
fazer o paciente caminhar. Substancias como tilenol, aspirina, cafeína não
devem ser utilizadas para não sobrecarregar os sistemas de metabolização do etanol.
Para entender a ressaca devemos revisar os principais pontos
da metabolização do álcool.
O etanol é um nutriente que produz calorias de baixo valor
nutricional. Nos tempos antigos, no ocidente não se fervia a água antes de
beber. Como era geralmente contaminada, causava doenças graves como cólera,
febre tifoide e diarreias. Isto não acontecia quando se consumia bebidas
fermentadas como vinho e cerveja que eram limpas. O uso de bebidas alcoólicas tem
mais de 10 mil anos. No oriente a historia é diferente. Há mais de 2 mil anos
se consume chá cuja água é fervida, portanto estéril. Os orientais não
precisaram consumir bebidas alcoólicas para evitas as doenças mencionadas.
O etanol é produzido pela fermentação de hidratos de carbono
por leveduras. A maltose forma glicose que em condições anaeróbicas gera
piruvato e este forma etanol e gás carbônico (CO2). Mantendo-se o CO2
junto ao etanol obtemos cerveja ou champanha (espumante). O etanol é solúvel
tanto em água como em gorduras e por isso tem grande capacidade de penetração
no corpo humano. Chega a todos os tecidos aonde chega a água e cruza todas as
barreiras orgânicas. Atinge rapidamente o cérebro. No estomago, uma parte é
absorvida sem necessidade de ser digerida. No estomago vazio, 20% do etanol é
logo absorvido e chega ao cérebro em um minuto. Outra parte é fracionada no
estomago por uma enzima, a álcool desidrogenase, formando acetaldeído. Esta enzima,
álcool desidrogenase existe em maior quantidade nos homens que nas mulheres. Os
homens metabolizam o álcool mais rapidamente. Outra consequência provocada pelo
álcool é o estimulo da secreção de ácidos gástricos. A presença de alimento no
estomago atrasa a absorção do etanol.
A porção de álcool que não é metabolizada no estomago passa
ao intestino onde é absorvido por difusão, sem necessidade de mecanismos
complicados mas diminuindo a absorção de outros nutrientes. Movendo-se através
das membranas celulares, atinge quase todos os tecidos e pela circulação porta
chega ao fígado. É no fígado que se dá a maior parte da sua metabolização. No
fígado, o etanol recebe prioridade e todas as outras metabolizações são
suspendidas até nova ordem. Primeiro, a álcool desidrogenase descompõem o
etanol formando aldeído acético; após, outra enzima, a acetoaldeido deshidrogenase,
desdobra o aldeído acético formando acido acético. Esta vai formar acetil- CoA.
A passagem de etanol a
aldeído acético depende de vários fatores. O primeiro é o gênero: as mulheres
tem menos álcool desidrogenase, além disso tem menos água no corpo, com menor
capacidade de diluir o etanol e metaboliza-lo. O segundo fator é a genética: os
ocidentais sofreram seleção natural porque a população sem as mencionadas
enzimas não podia tomar álcool e pereceram em maior número; já os orientais,
como ferviam a água, não tinham necessidade de manter preponderante a população
com enzimas. Uma grande proporção carece da acetoaldeido deshidrogenase com inibição da passagem de
aldeído acético a acetil CoA. O acetoaldeido permanece elevado e como é muito
tóxico, produz efeitos desagradáveis como congestão facial, dor de cabeça, e náusea
entre vários outros. Alem disso o acetaldeido é carcinogênico. Os asiáticos tem
alta incidência de câncer de boca e garganta. O terceiro fator que influi na
metabolização é o jejum. Nesta condição, varias enzimas são inibidas entre elas
as que desdobram o etanol. A seguir, vem a massa corporal: quanto maior a
quantidade de gordura mais lenta é a metabolização do álcool. Também tem
influencia a quantidade de etanol ingerido: a maioria das pessoas só metaboliza
uma dose por hora. (Uma dose padrão tem 14 gramas de etanol e corresponde a uma
lata de cerveja, 40 ml de uísque ou um copo de vinho de 130 ml).
Durante a ingestão alcoólica, a acetil-COA não pode
ingressar no ciclo cítrico porque para sua formação a partir do etanol é necessário
usar uma coenzima chamada dinucleótido de nicotinamida e adenina (NAD) que, ao
ser reduzida a NADH e H, transporta eletrons, liberando energia. Com o consumo
de NAD, este substrato fica escasso, com inibição do ciclo cítrico e a acetil-CoA
não pode gerar energia nem glicose. O caminho que permanece aberto é a derivação
da acetil-CoA para a formação de ácidos graxos com subsequente elaboração de triglicerídios.
Em outras palavras: o etanol se transforma em gordura.
Existe uma via alternativa de metabolismo do etanol chamada sistema
oxidativo microsomico do etanol, MEOS
pela sigla em inglês. Este caminho é utilizado quando a concentração de etanol
é tão alta que supera a possibilidade de ser metabolizado pela álcool
deshidrogenase. Por esta via o etanol também é desdobrado formando acetil-CoA,
mas com um problema: o MEOS também é usado para metabolizar outros tóxicos como
tilenol, aspirina, plantas tóxicas, anfetaminas, antidepressivos, alimentos
tóxicos e outros mais. Acontece que o álcool recebe prioridade pelo sistema e
este deixa de atuar sobre outras substancias. Se junto com o álcool outro
tóxico é consumido, a conjunção dos dois pode superar a capacidade do MEOS com
consequências perigosas. Por isso, muitas vezes a associação de um tóxico com
etanol, ambos isoladamente em doses não letais, resultam em morte.