Monday, November 05, 2012

Ressaca alcoólica


A ressaca pode ser definida como “mal estar em consequência do consumo de álcool”. O álcool presente nas bebidas como vinho, uísque e cerveja é o etanol; a ele me refiro, embora haja outros tipos como o metanol, proveniente da madeira e usado de forma muito perigosa em bebidas adulteradas.
A ressaca é uma das manifestações da ação do álcool sobre vários sistemas do organismo. Os sintomas são de tipos muito variados, começando por fadiga, fraqueza, dores de cabeça, dores musculares, sede, náusea, vômito, dores de estomago, vertigem, sensibilidade á luz e ao som. A atenção e a concentração ficam diminuídas e o sono fica alterado, deixando de ser reparador.  O humor se altera, aparecendo depressão, ansiedade ou irritação.
Existem muitos fatores que contribuem à formação de uma ressaca. Em primeiro lugar estão os efeitos diretos do álcool: desidratação, desequilíbrio eletrolítico, distúrbios gastro intestinais, hipoglicemia, distúrbios do sono e dos ritmos biológicos.
Algumas horas depois do consumo de álcool, pode aparecer uma síndrome de abstinência de curto prazo.
Também contribuem para a ressaca alguns efeitos não atribuíveis ao etanol.  As bebidas podem ter outros compostos tóxicos, especialmente metanol. O uso concomitante de outras drogas, especialmente a nicotina pioram o quadro. O tipo de personalidade (ansioso, depressivo, frio, culposo, agressivo, etc.) também pode ter influencia.
O único tratamento para a ressaca é a ingestão de água. Secundariamente, em alguns casos, a glicose como alimento (comer) pode ajudar, sendo desnecessária sua administração endo venosa. Não surte nenhum efeito fazer o paciente caminhar. Substancias como tilenol, aspirina, cafeína não devem ser utilizadas para não sobrecarregar os sistemas de metabolização do etanol.
Para entender a ressaca devemos revisar os principais pontos da metabolização do álcool.
O etanol é um nutriente que produz calorias de baixo valor nutricional. Nos tempos antigos, no ocidente não se fervia a água antes de beber. Como era geralmente contaminada, causava doenças graves como cólera, febre tifoide e diarreias. Isto não acontecia quando se consumia bebidas fermentadas como vinho e cerveja que eram limpas. O uso de bebidas alcoólicas tem mais de 10 mil anos. No oriente a historia é diferente. Há mais de 2 mil anos se consume chá cuja água é fervida, portanto estéril. Os orientais não precisaram consumir bebidas alcoólicas para evitas as doenças mencionadas.
O etanol é produzido pela fermentação de hidratos de carbono por leveduras. A maltose forma glicose que em condições anaeróbicas gera piruvato e este forma etanol e gás carbônico (CO2). Mantendo-se o CO2 junto ao etanol obtemos cerveja ou champanha (espumante). O etanol é solúvel tanto em água como em gorduras e por isso tem grande capacidade de penetração no corpo humano. Chega a todos os tecidos aonde chega a água e cruza todas as barreiras orgânicas. Atinge rapidamente o cérebro. No estomago, uma parte é absorvida sem necessidade de ser digerida. No estomago vazio, 20% do etanol é logo absorvido e chega ao cérebro em um minuto. Outra parte é fracionada no estomago por uma enzima, a álcool desidrogenase, formando acetaldeído. Esta enzima, álcool desidrogenase existe em maior quantidade nos homens que nas mulheres. Os homens metabolizam o álcool mais rapidamente. Outra consequência provocada pelo álcool é o estimulo da secreção de ácidos gástricos. A presença de alimento no estomago atrasa a absorção do etanol.
A porção de álcool que não é metabolizada no estomago passa ao intestino onde é absorvido por difusão, sem necessidade de mecanismos complicados mas diminuindo a absorção de outros nutrientes. Movendo-se através das membranas celulares, atinge quase todos os tecidos e pela circulação porta chega ao fígado. É no fígado que se dá a maior parte da sua metabolização. No fígado, o etanol recebe prioridade e todas as outras metabolizações são suspendidas até nova ordem. Primeiro, a álcool desidrogenase descompõem o etanol formando aldeído acético; após, outra enzima, a acetoaldeido deshidrogenase, desdobra o aldeído acético formando acido acético. Esta vai formar acetil- CoA.
 A passagem de etanol a aldeído acético depende de vários fatores. O primeiro é o gênero: as mulheres tem menos álcool desidrogenase, além disso tem menos água no corpo, com menor capacidade de diluir o etanol e metaboliza-lo. O segundo fator é a genética: os ocidentais sofreram seleção natural porque a população sem as mencionadas enzimas não podia tomar álcool e pereceram em maior número; já os orientais, como ferviam a água, não tinham necessidade de manter preponderante a população com enzimas. Uma grande proporção carece da acetoaldeido  deshidrogenase com inibição da passagem de aldeído acético a acetil CoA. O acetoaldeido permanece elevado e como é muito tóxico, produz efeitos desagradáveis como congestão facial, dor de cabeça, e náusea entre vários outros. Alem disso o acetaldeido é carcinogênico. Os asiáticos tem alta incidência de câncer de boca e garganta. O terceiro fator que influi na metabolização é o jejum. Nesta condição, varias enzimas são inibidas entre elas as que desdobram o etanol. A seguir, vem a massa corporal: quanto maior a quantidade de gordura mais lenta é a metabolização do álcool. Também tem influencia a quantidade de etanol ingerido: a maioria das pessoas só metaboliza uma dose por hora. (Uma dose padrão tem 14 gramas de etanol e corresponde a uma lata de cerveja, 40 ml de uísque ou um copo de vinho de 130 ml).
Durante a ingestão alcoólica, a acetil-COA não pode ingressar no ciclo cítrico porque para sua formação a partir do etanol é necessário usar uma coenzima chamada dinucleótido de nicotinamida e adenina (NAD) que, ao ser reduzida a NADH e H, transporta eletrons, liberando energia. Com o consumo de NAD, este substrato fica escasso, com inibição do ciclo cítrico e a acetil-CoA não pode gerar energia nem glicose. O caminho que permanece aberto é a derivação da acetil-CoA para a formação de ácidos graxos com subsequente elaboração de triglicerídios. Em outras palavras: o etanol se transforma em gordura.
Existe uma via alternativa de metabolismo do etanol chamada sistema oxidativo  microsomico do etanol, MEOS pela sigla em inglês. Este caminho é utilizado quando a concentração de etanol é tão alta que supera a possibilidade de ser metabolizado pela álcool deshidrogenase. Por esta via o etanol também é desdobrado formando acetil-CoA, mas com um problema: o MEOS também é usado para metabolizar outros tóxicos como tilenol, aspirina, plantas tóxicas, anfetaminas, antidepressivos, alimentos tóxicos e outros mais. Acontece que o álcool recebe prioridade pelo sistema e este deixa de atuar sobre outras substancias. Se junto com o álcool outro tóxico é consumido, a conjunção dos dois pode superar a capacidade do MEOS com consequências perigosas. Por isso, muitas vezes a associação de um tóxico com etanol, ambos isoladamente em doses não letais, resultam em morte.